Carta do Presidente do Juri do Cinema Mundo V Festival de Cinema de Itu

“ Há sempre um pouco de loucura no amor; mas há sempre um pouco de razão na loucura.”

NIETZSCHE

MAIS UM PASSO DO FESTIVAL DE CINEMA DE ITU

Para Renata Saracceni

Se é verdade que o ser humano, é o melhor experimentador de si mesmo, então o cinema é a sua melhor referência. E vê-se isso hoje, com mais intensidade criativa no curta-metragem, que nos longas perdidos entre o espetáculo fácil vindo das televisões, e a violência-espetáculo como intensificação de fascismos. O curta singularizou-se para não ser comum, e sim poético e plural. Uma permanente superação da banalidade, e dá explicação fácil. Daí a importância de curtametragistas como Sergio Santeiro, Sindoval Aguiar, Joana Oliveira, Leonardo Esteves, Zeca Brito, Joel Yamaji, Marcelo Ikeda, Andre Scucato, Abelardo de Carvalho, Fabio Carvalho, Isabel Lacerda… Felizmente a lista é grande.

Sem dúvida alguma, formuladores de potência para uma vida melhor, como subsistência da raça humana. O humano que vem sendo transformado pela política, pela religião, pelo dinheiro, pelo consumo e pela TV, numa eficiente máquina de guerra a serviço da segurança da inutilidade,  como sendo o único valor confiável. E mesmo a história cultural e artística, nos vai sendo imposta como casualidade de um criacionismo determinante e sem discussão.  Como se uma cultura e uma obra de arte não se impusessem além das causas, pelo seu sentido criativo e metafórico, pela consciência codificada e decodificada sem temer limites do popular ao erudito.

Ora, se a tarefa é só ilustrar, iludir, desterritorializar, deixa que Hollywood faz muito melhor do que nós. Aprendeu com Hiroshima, no Afeganistão e no Iraque matando e destruindo para depois ganhar reconstruindo. E não são máquinas de guerras? Quando foram diferentes? Nós ainda carecemos em nossa cultura e em nossa arte de forma e conceitos, até que a concepção do mercado venha a se impor como padrão totalitário de uma sociedade sem sujeitos, atípica, materializada como potência com poder absoluto para comprar tudo. Inclusive consciência. Nossa arte e nossa cultura não podem vendê-la. Forças obscuras se articulam, coveiros de interesses de todas as épocas, instâncias e casualidades. Não tem sido assim em todos os governos? Não foi sempre assim em detrimento do país, do sentido metafórico dos sujeitos? Com o conceito impondo-se à forma? Como uma máquina azeitada de tração nas quatro rodas, fazendo do corpo de Pasolini estrada para as imagens? Questiono sim, esse tempo de grandes aberrações políticas e culturais!

Mais que um simples Festival de Cinema, Itu faz um vivo encontro de idéias e afetos. Um compartilhamento amoroso de vanguardas. Uma luz nova de política cultural, trabalho e liberdade plena. Espaço mágico onde se pode entre lampejos de êxtases criativos, aspirar a plenitude da existência de múltiplos jovens cineasta ousados, profundos e independentes. Comparações e percepções muito além da mesmice do patético cinema de mercado, embrutecido pelo dinheiro e pela violência espetacularizada. Sendo eu já um velho cineasta, talvez não seja a pessoa mais indicada para falar de um evento como este, pois mal consigo entender o cinema como um pertence real dos nossos muitos sonhos proibidos. Ainda assim, uma bênção a criação e ao Festival de Cinema de Itu!

Digamos que essa “festa” reflexiva das imagens em Itu, é uma travessia rica entre esforços, ensaios, nobreza, doçura, empatia, generosidade, afeto… e levado ao longo dos seus muitos anos, por pessoas delicadas e criativas como Renata Saracceni, Joel Yamaji, Andrea Tonacci, Ricardo Miranda, Joana Collier, Fabio Carvalho, Isabel Lacerda, Helena Ignez, Paulo Cesar Saracceni… Promessas de um presente menos árido em relação à ortodoxia dos grandes eventos submissos ao mercado, onde se carnavaliza mais o cinema, que qualquer outra coisa. O Festival de Cinema de Itu, vai pela contra-mão do fundamentalismo das velhas relações de poder, onde filmes e pessoas são transformadas em mercadorias.

Claro que temos que enfatizar os Festivais passados, como forma e superação dos próximos que virão. E é perfeitamente plausível que se dê lugar a efervescência criativa dos novos tempos. De filmes mais complexos e ousados. Trabalhar a poesia sob a luz do afeto, é de certa forma deixarmo-nos levar rumo ao prazer de expressões e percepções muito além do baixo cinema-televisivo, que de modo algum quer que nada seja alterado ou mudado. E, digamos que, o desmantelamento de tais certezas, é o que pode fazer de melhor o curta metragem, empenhando-se em sofisticar a sua grandeza da crítica poética. E que em sendo uma força propulsora de novas idéias, o Festival abre um espaço de extrema beleza para todos. Compete a cada um de nós, dar brilho cultural a esse evento onde se enfatiza não a “coisa”, o ser-coisa – mas o humano lado das relações entre o olhar, o pensar, o fazer e múltiplos encontros criativos. Boa sorte ao próximo e aos próximos Festivais! Vida longa para estes raros encontros afetivos!

LUIZ ROSEMBERG FILHO/ RÔ

2011

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